Os dois termos são muito próximos, apesar de sua total diferença. Valores semelhantes e valores contrários. Uma convivência inimaginável e, totalmente, plausível no mundo de hoje. Ser duas coisas, para muitos, é algo normal.
Demonstrar várias personalidades parece ser uma constância entre nós. Fingimos, literalmente, aquilo que não somos, o que não queremos, somente para sobreviver em um mundo que abarca tantos antagonismos.
Somos uma sociedade convivendo com valores iguais e antagônicos quando desejamos paz para todos e vociferamos guerra nas redes sociais. Aliás, elas revelaram, no final das contas, todas as aberrações possíveis. Valores esses que são criticados por ambos os lados ou na polivalência dos lados. Afinal, podemos admitir que também funcionamos, diferentemente, de acordo com a conveniência.
As amizades entraram em choque, porque uma intolerância assumiu o lugar de destaque. Os valores ambíguos, contraditórios assumiram o protagonismo. Fazemos parte, cada um de nós, de uma coletividade, pensamos, geralmente. E, da mesma maneira, no privado, somos diferentes.
Somos ambíguos quando nos permitimos diferentes interpretações de nós mesmos, e vemos essa ambiguidade no outro. Comportamentos de acordo com a conveniência se servem mais da ambiguidade do que da sinceridade. Somos, totalmente, sinceros? Mesmo entre nossos pares somos diferentes, somos ambíguos. Podemos tolerar o outro enquanto aliado momentâneo, e dar distanciamento quando não é mais necessário ou importante. Nada é mais ambíguo que isso.
Somos ambivalentes quando nos pautamos em valores opostos. Nada como o amor e o ódio para exemplificar essa existência. Temos os dois dentro de nós e convivemos com eles, de acordo com nossos interesses. Amamos e odiamos com a mesma intensidade. Conviver com o amor, enlevados pelo espírito na saída de um culto, nos fechamos quando entramos na realidade das ruas, odiando o que os outros pensam.
Não existe nada mais ambíguo e ambivalente do que o culto de heróis. Alguns se dizem amorosos e compreensivos para com o próximo, e, no entanto, defendem uma eliminação física ou mental do oponente, porque o próximo é um escolhido, com características próximas ao inimigo desejado. O nosso próximo não é, exatamente,
aquele que está ao lado, mas que está na correspondência de pensamentos. Não amamos o próximo, amamos o grupo. Nada mais ambíguo.
Onze por cento da população brasileira permanece em isolamento contra a Covid, vinte e dois por cento da população declara que não está disposta a tomar vacina contra a enfermidade.
Como entender o amor ao próximo quando um percentual tão baixo opta por isolamento, tendo em vista que há uma grande parcela que poderia mantê-lo e inviabilizar o vírus? Ao mesmo tempo, como entender o amor ao próximo quando um percentual tão alto opta pela não inoculação, que poderia estender mais ainda a imunidade a todos?
Propagar o amor ao próximo, tomando medidas tão contraditórias, revela como a nossa sociedade ambígua e ambivalente não entende, absolutamente, nada do amor ao outro.