Na década de 60, houve uma febre das coleções em fascículos. E elas, definitivamente, estavam fora do meu alcance por absoluta falta de dinheiro. Olhava as bancas com os chamarizes para coleções de enciclopédias e lamentava não poder participar daquilo.
Quando vi a coleção Conhecer, uma enciclopédia, no cartaz de lançamento, toda vermelha e imensa, tive o desejo de possuí-la. A minha única alternativa seria economizar o dinheiro da passagem que minha mãe, nas idas e vindas da escola, me dava; e fazia longas caminhadas por causa disso. Torcia para que não chovesse muito forte e me restasse a alternativa de pegar o ônibus.
Falseei, é verdade, pedindo para minha mãe a passagem do ônibus mais caro, alegando que o mais barato demorava e sempre vinha muito cheio. Mas, dizia para mim mesmo: Era em troca de uma boa causa.
Lembro que o fascículo custava um pouco menos que uma semana de passagens, torcendo para que não houvesse feriados no caminho ou aumentos exagerados, o que atrapalharia minha contagem. E assim, no prazo de um ano, eu teria a minha coleção. Restava somente o drama da compra da capa, sendo que a encadernação ficaria para um futuro qualquer.
De vez em quando recebia uma ajuda inesperada dos meus pais, em troca de algum serviço, não percebendo, naquele momento, que eles já haviam notado aquela entrada súbita de fascículos na casa.
A oportunidade da compra da capa estava entregue à venda de uma pipa, algum negócio envolvendo meus botões de jogar e a essas ajudas inesperadas. Que vinham em meu socorro quando as coisas não davam muito certo. Mas jurava a mim mesmo que teria aquela coleção, e cada capa e seu conjunto de fascículos eram acondicionados em sacos plásticos, cuidadosamente guardados depois de lidos.
Repassava, com curiosidade, aquelas histórias resumidas de algum pensador grego, um estadista estrangeiro, e sobre o Brasil, me sentindo dono de um bem acima de qualquer outro.
Logrei chegar ao final e comprei com alívio o último exemplar, levando como um bem precioso aquele calhamaço de folhas livres de amassados e riscos, com quase ciúme, longe de outros olhares, reservado somente para mim, para as residências que, de tempos em tempos, meus pais mudavam.
Imaginava o dia em que poderia encadernar a coleção, dispondo cada volume em, quem sabe, uma estante que lhe fosse apropriada.
Anos depois, já empregado, ao ver uma banca de jornal bem em frente ao banco onde trabalhava, perguntei ao jornaleiro se sabia quem poderia fazer a encadernação. Quando lhe disse que se tratava da coleção, daquela coleção, notei um certo desdém, um comentário dele sobre a possível decadência daqueles livros e se valeria à pena o custo, tendo em vista que outras coleções faziam mais sucesso e seriam mais atualizadas.
Ele não entenderia o orgulho que ela representava.
Chegamos a um acordo e finalmente pude dar um grande final a toda ela, e, tempos depois, pude tê-la lado a lado, com seus volumes numerados em letras douradas.
Quando a olhava, não via uma coleção de livros, mas o resultado de um esforço além de mim mesmo, e que cada fascículo me custara longas caminhadas, fugas de chuvas, esperas embaixo de marquises, com algum daqueles fascículos dentro da minha mala, agarrado com proteção, mais do que os livros.
Lembrei-me de alguns dos negócios que fiz, para cada fascículo, capa vermelha e os alisava com carinho, vendo, de fato, o resultado de um esforço.
Dali por diante, cada objeto de desejo foi conseguido com o sabor único da caminhada. Sabendo que o resultado final era possível, bastando a determinação de uma simples força de vontade.

 

 

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